Tudo fora do exercício do amor é
bobagem.
Acorda, salta da poltrona. Olha
em volta. Onde?... Barulho de carro... anda pela sala... meio dia e meia.
Garrafas, copos, restos de comida... [O cheiro do resto de comida.] Vinho no
tapete. Em um cômodo... noutro... nada. No banheiro, latas de cerveja. Da
janela, o quarto andar. Onde?! Houve? O quê e quem? (T) E ele?! Pega o tênis
que vê pela frente. Cheira, é o seu. Calçando, silenciosa aceleração. Wham!
Bam! Elevador no térreo! Parado. Depois de esmurrar, desce pela escada pouco
enxergando. {Animais adoram segurar porta de elevador}.
tututututu tu um, dois, treis,
tututututu tututu um, dois, treis,
tututututu tututututu um, dois, treis,
tututututu tututututututu um, dois, treis,
Descendo a escada passa por um
casal trepando, pede licença, pede desculpa, em outro vão esbarra numa velhinha
andando de andador. Escora a velha, pede desculpa, segue. Térreo. Um
senhor empurra com o corpo a pesada porta de entrada do prédio. Sacolas de plástico
nos dedos, punhos, antebraços. A luz de fora entra no hall obscuro, ela passa
pela fresta do senhor, ganha a calçada e pára.
Coração em descompasso, dia nublado,
A nuvem negra olha para ela, sorri.
O vento redemoinha embaixo da saia,
O relâmpago anuncia o trovão, que diz:
“Se apresse!” O grave
retumba no seu ouvido até voltar o som da rua. Obedece. Corre, atravessa entre
carros, dança com buzinas, esbarra [safanão proposital] em executivo
precipitado, olha pra trás achando graça, vê a boca dele se mexendo perplexa.
Salta bueiros, quebra direitas e esquerdas, sobe e desce, calçada, rua, cruza
galerias, gente em vitrine conversa com telefone e ela corre. Um grita – vem
pro tio! -, ela tira o casaco, correndo, e o larga no chão. Já sua. Numa
quebrada, um muro branco. Mão no bolso, caneta de muro, está ali, sempre. "Fui
oiá pra ocê, meus oinho fechô". E um coração circundando. A
chuva vem abaixo de repente. Pingos largos marcam o asfalto que rapidamente se
transforma num pingo só, um grande pingo. A água bate em sua testa misturando
com o suor, a face corada recebe a chuva em estado de embriaguez. Abre a boca e
sorve como o último líquido que se entranha. A roupa cola ao corpo, o tênis
range imerso na enxurrada, os barquinhos de papel descem à toda. Alguns
desgovernados se chocam e é este choque que os orienta no percurso. Foge dali,
corre, “se apresse”! Falta pouco, alguns passos. Ele a poucos metros, a uma
extensão de alguns braços. /T / T / T / Curva, joelho, chão na boca.
Beija. Língua enquanto tira o tênis com agilidade. O paralelepípedo, as
sobrancelhas, o atrás das orelhas, o pescoço, as costas, o sexo, os dedos dos pés,
o paralelepípedo. Uma corrente passa e desgruda da língua todos os beijos,
levando-os pra onde sempre vão as águas. Vira, deita, braços e olhos abertos
lhe trazem muito perto o lugar onde se movem astros. Lava Olhos, Lava Orelhas,
Lava Pés. A torrente continua. Os galhos acompanham o vento, o vento desliza em
seu cabelo. Relâmpago rasga e trovão dá seu ultimato: ela, com força desmedida,
rasga saia, rasga camisa e, nua, permite que a chuva faça o reconhecimento do
seu corpo.
Peito/ Montanha
Bico do peito/ Pico
Umbigo/ Cratera
Cabelo/ Cipó
Sexo/ Lagoa
O 'Enthusiasmós, o Grande' vem
vindo no rabo do vento do não-se-sabeonde, apeia e invade os buracos dela,
todos a um só tempo. Não vemos tubos nem vísceras nem as portas abertas, mas em
instantes seu corpo levita. Uma força exuberante, uma ordenação perfeita. Entre
a surpresa e o entendimento, ouve uma voz muito bonita, lírica e mansa, dentro
da sua cabeça?, ao pé do seu ouvido?, não tem ninguém por perto!, em seu ouvido
interno? [alma tem ouvido?]. O que ela sabe é que ouve. Como uma canção de
ninar sem ser, uma fada de outra língua sem ser, uma voz que não a sua dentro
dela, pintando o espaço com notas irrevogáveis. O sol, com um único raio,
abre passagem entre as nuvens. Incide em sua retina, a assenta de volta à
terra; o corpo toca o chão, o chão segura o corpo. Pressiona as mãos na superfície
pra se certificar. Por um momento pensou que levitava! O pranto se mistura à
tenra chuva. Água/colírio/lágrima. Gargalha, chora, ri, soluça: o momento não é
de ponderação. Vê um ilustre arco-íris que se formou no céu se tornar mais
brilhante. A chuva agora é uma fina cortina de voil. Ela é daquilo tudo, aquilo
tudo é dela. [É de todos.] E, imersa na clarividente harmonia dos corpos, finca
os pés e apruma e as pernas vão sozinhas até o portão do prédio dele. A poucos metros
dali. Como se flutuasse, deixando o nada trás. Sobe pela escada de emergência
para não ser vista por moradores. Está nua, mas seus pés úmidos se contornam no
piso. Esão mais perto a cada degrau. Sua vulva desabrocha graficamente.
Paralela cadência, ele, em seu apartamento, tem o sexo desperto como soldado em
campo de batalha, coisa de desenho animado, que avisa a ele que ela está por
perto. Esta simbiose faria qualquer John A. Fleming morrer solitário pela causa
que, vale dizer, a ciência e a moral (sic) jamais foram capazes de enfrentar. Finalmente
a porta se abre, basta um leve toque e ela o vê de pé, nu, teso, à sua frente e
à sua espera. Ambos esboçam sorrisos, não uma afirmação: resultado da borbulhança, da tremura,
da agitação. O Sangue corre mais veloz, a Serotonina se lança em festa nos braços
dos Neurônios, mas não conseguem roubar a atenção: Testosterona e Estrogênio
estão exuberantes, sendo carregados em massa pelos demais hormônios. Pós-algazarra,
os corpos iônicos se aproximam. Todos querem assistir ao espetáculo, que começa.
nariz/nariz
pé/pé
boca/orelha
sexo/coxas
boca/pescoço
boca/orelha
boca/boca
boca/peito
língua/mamilo
mão/bunda
língua/umbigo
nariz/sexo
dente/coxa
boca/pé
boca/dedos do pé
nariz/perna
nariz/sexo
boca/sexo
sexo/sexo
São um só corpo, um só espírito,
um só perispírito, uma só alma, {espaço reservado in memorian a todas as nomenclaturas de todas as
religiões}, um só cuspe, um só
cheiro, suor, são um só. Abre, penetra, desliza, enterra, beija, rola, ajoelha,
continua, treme, deita, levanta, sussurra, vira, senta - os movimentos são
conduzidos per si e nada excede
nem falta: perfeita coreografia do “Ato Ininterrupto da Paixão”, duração: 2
horas e dezessete minutos. Até chegarem ao ápice, ao clímax, ao deus: o Longo
Gozo, o senhor dos amores, que eleva corpos a dimensões e épocas sem que se
movam, um todo gáudio onde o sagrado regozija, hábitat das esferas primitivas.
Profanos deuses. Depois Dele, os corpos são devolvidos para onde nunca saíram:
a sala do apartamento. A respiração retoma seu pulso, o suor escorre
refrescante, os olhos abrem saciados. O mundo, equilíbrio perfeito: ela no
encaixe dos seus braços. “Vamos tomar banho? (T) Dorme, dorme, pode
dormir.” Entra no chuveiro, ensaboa o sovaco esquerdo, o direito, e o
central. Que a água lava, a toalha leva e na face, a lembrança.
Seca-espelho-barba abotoa chamando suave. Vamos? (T) Oi. (T) Menina, vamos
levantar. Nem um murmúrio. Vai até a cozinha, toma um gole d’água,
bate a porta da geladeira pra fazer barulho. Pisa forte, arrasta: Nada. Nada
dela acordar. Respira fundo e alto - Acorda! Tenho que sair! Ou! Você não
vai trabalhar? Ô menina! Ajoelha, toca o rosto sem sinal. A boca. Beija a
boca. Fria. Mas, como? Agora mesmo/ Sacode. Fala comigo! Tô
aqui! Olha pra mim! Estapeia, esmurra, nem um sinal.
ouvido/peito
boca/boca
ouvido/peito
boca/boca
ouvido/peito
Traz para si. Cheira. O corpo
ainda guarda o seu. Escorrega suas mãos pela plácida-textura-estátua-perfeita:
a sua morada. A que sonhara. Morada só dele e de mais ninguém. Dele dele dele
dele {minha minha minha minha}. Escrafuncha os fundos: quentes e úmidos. Lambe
voraz engole o sumo enterra os dedos. Zíper cona encharcada introduz seu úmido
ereto. Que o sopro traga ela de volta!... Goza. Levanta, anda de um lado a
outro. Quebra quadros, porta retratos, abre e fecha a geladeira, foi as unhas. Continua rígido. Um depositário de porra no meio
da minha sala! Preciso tirar ele dali. *** Pega
pela cintura, agarra, o peso joga-os sentados no sofá, ela em seu colo, brinca
com a filhinha, pocotó, goza mais uma vez. Atira o corpo imóvel com todas as
forças ao tapete. Esmurra a parede. Vai ao banheiro, joga água no rosto, joga água
no corpo, se enfia no chuveiro. Quando sair dali vai ver que é tudo um delírio.
Seu macho é insaciável, precisa ir à rua, precisa que ele abaixe. Se masturba
no chuveiro, pensa nela, urra de prazer, bate a cabeça no azulejo, pega a
toalha, sôfrego, respira, sai do banheiro. Pé ante pé, caminha até a sala.
Quando chegar vai ver o sofá, as poltronas, mais nada! Lá está ela!!!!!!!! As
pernas abertas!!!, a xota queimando, chamando por ele!!! Deeeeeeeeeeeeus!
Deeeeeeeeeeeeeeeeeeeus!!!! Corre até a porta, trancada, não encontra a chave!
Seu pau vai crescendo, crescendo, incha, ele corre em volta dela, em círculos,
desesperado, quer sair dali, não consegue, paredes invisíveis limitam o centro
da sala, ela também no centro, está cercado!!! Seu pau vai tomando a dimensão
da redoma, ele grita Deeeeeeeeus!!!! Deeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeuuuus!! Cai
de joelhos por cima dela e esporra um imenso jorro que a cobre inteira.
Aaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Estremece, tomba e, em seu último suspiro,
ouve-se a monossílaba mor.
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