(...) nº 1

"Metrópolis", de Fritz Lang - 1927- Alemanha

Digito a última palavra do relatório de hoje que salvo na área de trabalho como "Relatório 177" e envio para a Corporação, com cópia para todos os departamentos. Todo fim de expediente a mesma coisa, amanhã será o 178 e assim por diante, até chegar ao duocentésimo quinquagésimo quarto relatório, do último dia útil deste ano de maior número de dias úteis da última década. Ano passado foram duzentos e cinquenta e consequentemente duzentos e cinquenta relatórios. Ano retrasado foram duzentos e quarenta e nove. Este ano tem duzentos e cinquenta e quatro porque tem feriado pra todo lado caindo nos sábados, o que por um lado é bom porque sábado é praia, e quando é feriado a praia fica cheia de gente bonita, gente de fora, e é só gente bonita pra lá e pra cá, então eu me sento no meu quiosque sagrado com minha latinha que saco magistralmente do isopor portátil que levo de casa com gelo de forma e meio litro de álcool que é pra conservar e então me sento ali e me ponho a ver as belezuras porque feiura eu nem vejo e nem sei que existe. Então rezo rezo agradecendo a Deus.


Amanhã é domingo!

Depois segunda...

Dia de semana ando rápido. Saio do trabalho atravesso a praça redonda em linha reta passando pelo ponto central. Traço diâmetros, sempre com perfeição, encurto caminhos. Tenho pressa, dia de semana sempre tenho pressa, o sol sempre cai e eu sempre quero pegar a luz do fim do dia em casa.
Chego, jogo a pasta em cima da cama, abro a cortina a janela libero os punhos tiro sapato meia, úmida. Destampo a lente, me posiciono.


Vejo que há coisas incomuns. Muito incomuns, pra falar a verdade. Cama arrumada, cabelos penteados. Zoom (...) Engraçado, agora penso, é como se ela já estivesse pronta para o ocorrido logo depois. Pensar que realmente as pessoas podem pressentir o futuro ou alguma tragédia pessoal, algo que lhes mude o destino, contrariando a cegueira de Édipo, é algo que me assusta. Ah, Tirésias, Tirésias! Tudo se mostra agora extremamente coerente.
Ela continuou sentada na cama arrumada, cabelos penteados, olhando pela janela. Via-se o céu e ela parada, só olhando. O sol nasceu e antes a noite as cigarras as nuvens vermelhas indicando a programação do dia seguinte. Do vermelho fez-se o roxo e púrpura e então a cor da manhã. E os pássaros.


Nada entendo de nada, são mil e uma voltas, vou viver mais de cem, é verdade, é genético!, mas não dou conta, não dou conta!, continuarei sem entender.


Fecho minhas cortinas.


Três horas de sono.


O Dia seguinte


Dia de semana ando rápido. Saio do trabalho atravesso a praça redonda em linha reta passando pelo ponto central. Traço diâmetros, sempre com perfeição, encurto caminhos. Tenho pressa, dia de semana sempre tenho pressa, o sol sempre cai e eu sempre quero pegar a luz do fim do dia em casa.


Chego, jogo a pasta em cima da cama, abro a cortina a janela libero os punhos tiro sapato meia, úmida. Destampo a lente, me posiciono.


Ela na cama desarrumada, cabelos desgrenhados. Do roxo fez-se o vermelho e então o escuro da noite. E os urubus.


Nenhum comentário:

Postar um comentário